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O amor é simplesmente o ridículo da vida

Foto: Walter Firmo
    A minha irmandade com Luiz Carlos da Vila é realmente uma coisa que volta e meia provoca em nós emoções, gargalhadas e prazeres absurdamente generosos. Já começa com um lance muito doido que é o fato da gente não se lembrar como se conheceu. A primeira vez que eu soube dele foi numa entrevista que ele deu ao Jornal do Brasil.
    Puxa! Deu s
    audades agora do Jornal do Brasil da época em que ele é que formava opinião cultural, quer dizer, ele também. O Rio agora só tem um jornal com esse poder e aí perdem os artistas e perde o público que não têm linhas editoriais diversificadas a sua disposição.

    Mas aí, lendo a entrevista do Luiz, me amarrei e pensei: preciso conhecer esse cara.
    Não sabemos onde isso começou, mas a lembrança dele na minha casa, desde o tempo do primeiro casamento, e olha que já se foram quatro, é muito forte.
    Já estivemos juntos em várias paradas que já renderam parceiras em vários sambas e tive o prazer de acabar virando produtor de alguns discos dele (A luz do vencedor e Benza, Deus) e ainda gravamos um juntos (Matrizes).

    Um desses encontros foi no ano de 1988 quando a Vila Isabel desfilou com o enredo Kizomba, festa da raça. A Vila foi campeã, o samba do Luiz virou um sucesso eterno e tudo mais. Mas teve uma passagem antes disso tudo que foi muito legal. Este foi o ano em que pela primeira vez desfilei tocando violão no carro de som ao lado do Alceu Maia no Cavaquinho. Encontrei o Luiz antes na concentração e resolvemos dar uma caminhada pra ver como estava a Escola.
    Depois de algum tempo olhando em silêncio a gente sentiu que alguma coisa boa estava pra acontecer, não imaginávamos a vitória, porque desde aquela época quem comanda o carnaval é o luxo. Mas a escola estava belíssima ”vestindo Palmares tão linda para Zumbi...”.
    A Vila entrou com uma garra danada, mordendo, cantando, dançando, alegre, orgulhosa do enredo, deixando gente como meu amigo Jorge Aragão boquiaberto sem entender o que estava acontecendo, lá da sacada da Globo no Sambódromo.

    Essa introdução para contar que na última quarta feira essa emoção aconteceu mais uma vez quando eu e Da Vila fomos assistir ao show de Áurea Martins, Ângela Evans e Hermínio Bello de Carvalho lá no Centro Cultural Carioca. “O amor é simplesmente o ridículo da vida”.
    De cara sentimos que a noite ia ser boa, não só pela casa cheia, mas também pelos vários amigos de classe que lá estavam prestigiando o show dos três.
    Hermínio começou expondo imagens de seu acervo onde a entrevista com Aracy de Almeida é de chorar, de rir e de emoção. Em seguida à projeção, Hermínio Bello canta que quem o navega é o mar, assumindo charmosamente a dália para não esquecer as letras, o que termina compondo o belo personagem do poeta envolvido com seus papéis. “Os papéis que eu varei noites pra escrever um samba...”, como diz o outro poeta Luiz Carlos da Vila.

    Aquele balde de latinhas de praxe e estávamos ali entregues as ondas que vinham daquele palco para platéia. Ondas de emoção, de riqueza cultural, de música do mais alto nível, de poesia de Hermínio e do canto dos anjos Áurea e Ângela.
    É lógico que as lágrimas foram liberadas pouco a pouco. Umas quando Ângela cantou nossos sambas e outras quando Áurea abre sua apresentação cantando Jonny Alf.
    Terra Trio e Lucas Porto em acompanhamento leve, delicado, envolvente, como o show pede e como Hermínio gosta. Copo d’água artístico que aliviou um pouco essa sede de cultura musical em que vive o Rio de Janeiro. Um show de música para se ouvir, sentir, se emocionar e refletir. Hermínio encerra cantando mais uma vez que quem o navega é o mar, só que dessa vez com versos atualizados e com o totalmente tiete nipe de palmas, com uma divisão diferente, executado por mim, Luiz, Ana Costa, Simone e Zélia Duncan.

    Alô respeitável público do Brasil! Vamos prestar mais atenção aos que estão aí na ativa arriscando, aprendendo, ensinando, inovando, insistindo, defedendo, batalhando, curtindo, vivendo, cantando, tocando, compondo, fazendo, amando a música brasileira, mesmo que tudo isso hoje em dia possa parecer ridículo. Até o próximo encontro Luiz Carlos.

    Comentários

    Anônimo disse…
    Eu vi semana passada com o Martinho.
    Show emocionante mesmo!
    lindo relato!
    Celso
    Anônimo disse…
    A projeção da entrevista com Isaurinha Garcia exaltando o amor que sentia por seus passarinhos e pela natureza.. e, é claro, a presença de Zezé Gonzaga na platéia deixaram a noite ainda mais especial! ;) Todo esse amor pela vida, pela poesia e pela música, cantado com maestria e sentimento.. só pode dar nisso: lágrimas sem fim.
    Parabéns pelo blog!
    Bjos, Gabi :)
    gabidecara@gmail.com
    Cláudio Jorge disse…
    Foi tudo muito lindo mesmo, Gabi. Volte sempre por aqui. Obrigado. Beijos.
    Anônimo disse…
    Assistí tb e achei tudo muito bonito a começar pela luminosidade da Aurea Martins que tem brilho até no nome.
    Vale u Cláudio.
    Chico Alves
    Anônimo disse…
    Alô, Cláudio

    Valeu pela presença e pelos elogios! Sorte mesmo é ter o seu violão na gravação da nossa música na voz da Angela, uma verdadeira seleção de feras!

    abração pra você
    Lucas Porto
    Cláudio Jorge disse…
    Valeu Lucas, volte sempre. Um abraço
    Anônimo disse…
    Claudio parabéns pelos seus textos e sua arte.Eu tenho o Coisa de Chefe, muito bom.Como acho os outros discos.
    Mande-nos seu endereço para mandarmos edições dos jornais para você.
    Cláudio Jorge disse…
    Obrigado 'Samba é meu dom". Vou visitar a página de vocês e conto tudinho. Felicidades.
    CidadãoEu disse…
    Este comentário foi removido pelo autor.
    CidadãoEu disse…
    Quando poderei ver esse show em sampa? Já estou com a "água cultural" na boca!!! rs

    Tive o prazer de conhecer o Luiz no SESC Pompéia, se não me engano em Show do Quinteto em Branco e Preto, num lançamento do seu segundo CD. Conversamos por pouco tempo pois ele já estava num corre danado atrás de quem fosse levá-lo ao bar do Timaia, rs. Foram 10, 15 minutos de risadas e de satisfação para mim e meus amigos, Rodrigo Cuíca e Fabão do Cavaco.

    Também assisti ao show do Luiz com o Moacyr Luz, só os dois. Se te contar o que esses aprontaram no palco do SESC Santo André você provavelmente rirá muito também porque nós rimos até chorar, rs.

    Uma rápida passagem: cada um cantava dois, três sambas. Ai o Moa estava cantando e o Luiz falando algo no ouvido dele. O Moa estava quase rindo enquanto cantava e foi então que, ao terminar a música ele disse: "Vai você Luiz...". O Luiz levantou e, em vez de cantar, já que era a hora da sua entrada, ele saiu do palco tropeçando no pedestal e no fio do microfone, rsrs, foi embora... o Moa sem saber o que fazer disse: "Então vou eu" e continuou cantando. No meio da segunda música voltou o Luiz com dois copos na mão, um para ele e outro para o parceiro, rsrs. Então o Moa perguntou: "O Luiz, onde você foi? Era sua entrada!" e o Luiz: "Ah, você falou pra eu ir eu fui... fui buscar um negócio pra molhar nosso bico", rsrsrs. A platéia quase veio abaixo com eles. Tudo de bom mesmo!

    Foram poucos minutos que nos deram a certeza de que esse cara é uma figura incrível e a convivência com ele deve ser tudo de bom.

    É isso... enquanto minha sede cultural vai sendo suportável graças a algumas poucas goteiras que a minimizam com sua escassa, mas cristalina água, vou aguardando a enxurrada de H2O musical que deve ser esse show do Hermínio.

    Abraços e estou lhe esperando no meu blog.

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